
Em uma tarde ensolarada de junho, um artista que se descreve como “arquiteto dos pássaros contemporâneos” parou na frente de um prédio comercial vazio no SoHo, subiu em uma escada telescópica e começou a tirar medidas para o que seria sua próxima obra-prima.
Ele tinha chegado minutos antes, como quem não quer nada, usando um macacão escuro, puxando um carrinho com vários equipamentos. A seguir, colocou um capacete branco, um cinto de ferramentas e um colete refletivo de segurança laranja. “Geralmente, eu ando por aí fantasiado”, diz ele, referindo-se à estratégia de se vestir como funcionário de obras públicas para evitar ser impedido de fazer algo considerado tecnicamente ilegal, “mas é difícil aguentar o calor”. As pombas nem o notaram, muito menos a polícia.
XAM é o nome que ele usa para preservar o anonimato (e só concordou em dar entrevista sob a condição de que o usássemos também). Há três anos, exibe sua arte de rua na forma de casas de passarinho – e, embora o termo pareça inadequado, as estruturas são, de fato, abrigos para aves. Muitas lembram peças de um quebra-cabeça ou são pintadas em estilo camuflagem, possuem um sistema passivo de ventilação, jardim na “cobertura” e lâmpadas LED movidas a energia solar que atraem insetos.
Aludindo à crise imobiliária norte-americana, algumas têm até placas com avisos tipo “De propriedade do banco” ou “Em execução” bloqueando a entrada; outras estão equipadas com pratos de satélite (que não funcionam, claro).
O projeto Habitat Urbano, como XAM chama seu trabalho, fez parte do Idea City Festival, do New Museum, lançado em maio deste ano, e algumas peças forem exibidas na Galeria Dorian Grey de Nova York, mas continuam a surgir novidades o tempo todo em cidades como Nova York, Los Angeles e Cidade do México.
Para Christopher Pusey, um dos donos da galeria, a combinação do formato e utilidade é o que diferencia as casinhas de outras formas de arte que se vê por aí.
“Fiquei embasbacado com a precisão dos detalhes. Elas são muito bem elaboradas e de uma forma muito criativa”.
Apesar do requinte dos detalhes, a intenção não é mantê-las em uma sala branca impecável, mas, sim, na rua, onde XAM já instalou mais de cem desde 2010, desde o Brooklyn até Los Angeles. É claro que, nos bairros onde os moradores estão antenados com a arte das ruas, os pássaros urbanos, por mais intrépidos que sejam, raramente duram muito.
“Tem uma área perto do centro de Los Angeles bem industrial, é a minha favorita. Já voltei inúmeras vezes e ainda vejo as minhas obras por lá. Se eu colocar uma em Williamsburg, amanhã já era”.
Histórico. XAM tem 30 anos e uma história pouco comum para um artista de rua do Brooklyn. Criado em Santa Barbara, na Califórnia, ele estudou arquitetura e design no Instituto de Artes de Chicago. Hoje, ganha a vida se alternando entre a manutenção de prédios em meio período, projetos de design gráfico como freelancer e técnico de iluminação em eventos.
Foi sua curiosidade e interesse em desmontar coisas que o levaram a criar seu alter ego, um robô chamado XAM. (O nome é em letras maiúsculas mesmo, para ser lido como se fosse um acrônimo, embora não signifique nada). Na verdade, ele gosta de demolir obras da arquitetura contemporânea, ou o que seria a sua versão de desmontar as coisas, mas se satisfaz construindo as casinhas de passarinhos. Seu corpo aparece de forma abstrata nos blocos roxos de diversas obras.
A princípio, XAM criava unidades padrão e as instalava onde podia, como nas placas de trânsito bem posicionadas – geralmente, lá pelas 5h30, quando há poucos pedestres e/ou policiais para prestar atenção em um cara de dreads subindo em um poste.
Ultimamente, porém, passou a usar cantoneiras ou outros detalhes arquitetônicos no exterior dos prédios como suportes improvisados e a criar as casinhas de acordo com lugares específicos – e, graças à roupa de operário, pode fazer a pesquisa que quiser e ainda se divertir um pouco com a teatralidade toda da situação.
FONTE: http://www.otempo.com.br